Sobre a fé

Demorei para encontrar uma religião, mas hoje ela me ajuda nos momentos mais difíceis

Fui criada numa família nuclear de católicos não praticantes. Fui batizada, mas não fiz primeira comunhão. Quando a época de fazer a escolinha de catecismo chegou, eu inclusive estudava em uma escola católica, mas meus pais me deixaram à vontade para que eu decidisse fazer ou não. E, naquela idade, na quarta série do ensino fundamental, se a atividade não envolvesse correr, pular e brincar eu não estava muito interessada. Não fiz.

E ao longo dos anos nunca senti falta de ser uma católica praticante, nem mesmo quando casei e as pessoas, por vezes extremamente horrorizadas, me diziam que eu precisava fazer um “intensivo de primeira comunhão e crisma para ontem.” Por uma série de motivos, acabei casando apenas no civil.

Com todo o meu respeito a qualquer religião, confesso que os rituais das missas, com o senta-levanta-ajoelha-canta, nunca me deixaram muito à vontade. Tampouco os gritos das manifestações do único culto evangélico que participei. Nesse, eu tive que sair na metade pois todo aquele barulho me causou uma agonia profunda. Talvez pelo fato de eu já ser muito barulhenta, precisava de um contraponto. E isso tudo foi muito antes de imaginar que um dia teria depressão.

Por outro lado, as palestras dos centros espíritas e os passes sempre me tocaram de uma maneira muito especial. Tudo quieto, calmo, tranquilo. Sem senta-levanta-ajoelha-canta. Sem gente gritando. As palestras são ministradas por “pessoas normais”: mães, pais, avós, tios. Todos com vidas iguais às de todo mundo. Faladas de igual para igual e, o melhor, com espaço para perguntas! Justo eu, que amo um debate, me encontrei. E ficava imaginando que escândalo seria levantar a mão durante a missa e dizer algo como: “Sr. Padre, com todo respeito, o senhor não acha que nesta parte da Carta aos Coríntios há mais de uma interpretação possível? Pois eu entendo que blá-blá-blá.” Definitivamente não.

E foi por meio do ‘Evangelho Segundo o Espiritismo’ que eu encontrei respostas para algumas questões importantes sobre a minha fé. Uma das orações – a Nas Aflições da Vida – se tornou um mantra para mim. Repetia com todo o meu coração nos momentos mais terríveis, nos de maior desespero e dor. Ela resume tudo que eu sinto em relação a acreditar em Deus, e eu acredito muito, mas também sobre como ele nos dá ferramentas para lidar com nossas lástimas. Para passar por elas nos valendo daquilo que Ele nos deu: o próximo. Afinal, se Ele fez com que muitas pessoas se interessassem em estudar Medicina, Psicologia, Enfermagem e tantas outras áreas ligadas à saúde, eu creio que também é meu dever honrar essas pessoas e suas habilidades. E essa oração diz assim:

“Deus Onipotente, que vês as nossas misérias, digna-te de escutar, benevolente, a súplica que neste momento te dirijo. Se é desarrazoado o meu pedido, perdoa-me; se é justo e conveniente segundo as tuas vistas, que os bons Espíritos, executores das tuas vontades, venham em meu auxílio para que ele seja satisfeito.

Como quer que seja, meu Deus, faça-se a tua vontade. Se os meus desejos não forem atendidos, é que está nos teus desígnios experimentar-me e eu me submeto sem me queixar. Faze que por isso nenhum desânimo me assalte e que nem a minha fé nem a minha resignação sofram qualquer abalo.”

Para mim é um hino! De fé, de protagonismo da própria dor e, sobretudo, de resiliência. Pois muitas vezes é disso que precisamos enquanto as visitas inconvenientes não vão embora. De calmaria e mansidão. De acreditar em Deus, mas também depositar a fé no ser humano. Incluindo nós mesmos.

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