Acionistas da Sanepar vão bem, os consumidores não

Em 2019, estatal gerou R$ 394 milhões em dividendos, mas não construiu barragem que podia amenizar racionamento

Desde que as ações da Sanepar entraram na Bolsa de Valores, a empresa tem entregue bons resultados aos investidores. Em 2019, a estatal de Saneamento do Paraná chegou a pagar aos acionistas só em dividendos e juros R$ 394,6 milhões, o equivalente 41,15% do total de investimentos da empresa no ano passado – em torno de R$ 1 bilhão, segundo o Dieese.

Agora nem tudo vai tão bem no mercado: as ações mais caras da empresa que já chegaram a valer mais de R$ 84,00 em março, com a crise pandêmica e a estiagem estão no patamar de R$ 30,00.

Em compensação, nos últimos anos, os acionistas faturaram um bom dinheiro em uma das companhias que pratica uma das tarifas de água e esgoto mais altas do País, com aumento de 111% entre 2012 e 2018, 41% acima da inflação no período, fora o reajuste de 12% autorizado em 2019 pelo então recém eleito governador Ratinho Júnior.

Do outro lado da história estão mais de 800 mil consumidores da Sanepar que penam com o racionamento de água há quatro meses e precisam programar suas vidas para antes ou depois do rodízio, que começou em 17 de março. Lavar louça, roupa, tomar banhos ou fazer qualquer coisa que necessite maior uso de água são tarefas limitadas pelo rodízio que suspende o fornecimento de água por 24 horas, só que o racionamento pode durar dois dias ou mais em alguns bairros ao Sul de Curitiba e da região metropolitana.

Vão dizer que o racionamento é culpa da emergência climática, de São Pedro ou que a Sanepar não é pajé. O que a Sanepar poderia ter feito? Como empresa pública considerada de excelência, a estatal sabe desde outras estiagens da importância de investimentos urgentes na ampliação do sistema de abastecimento de água na Região Sul de Curitiba e Região Metropolitana, onde o racionamento faz sofrer milhares de famílias em meio a uma pandemia.

A estatal sabe tanto do problema que, em 30 de junho 2015, lançou o edital para a construção das obras na bacia do Miringuava – que se estivessem concluídas conforme planejado beneficiariam justamente os moradores ao Sul de Curitiba e da Região Metropolitana, que enfrentam hoje o mais dramático racionamento de água na cidade, com possibilidade de agravamento se não chover em setembro, início da primavera.  

Nada deu muito certo com esta obra. Em setembro de 2015, a empresa Catedral Construções Civis, de Campo Largo, foi declarada vencedora da licitação da barragem, mas o contrato só foi assinado pela Sanepar dois anos depois, em abril de 2017. No processo publicado no Diário de Justiça em 29 de janeiro deste ano, no qual a Catedral pediu recuperação judicial, a empresa informa: “mesmo alegando que as obras eram de urgência, (a Sanepar) nada fez para dar andamento ao contrato”.

Segundo a Catedral, “as obras também dependiam de um projeto básico, objeto de contrato anterior entre a Sanepar e Engevix”. O projeto da Engevix foi feito, mas, segundo a Catedral, exigia aditivos para a execução da obra. “A Sanepar negou-se a contratar os aditivos – o que paralisou as obras”, diz a Catedral no processo.

Em 2017, um outro problema para a Sanepar: relatório da Agência Nacional de Águas (ANA), mostrou que a barragem do Miringuava apresentava “comprometimento estrutural importante”. A Sanepar abriu processo administrativo contra a Catedral, que está em sigilo.

Aparentemente o nó da obra do Miringuava foi desfeito em janeiro deste ano quando uma nova empresa foi licitada para executar as obras da barragem: a Mecanorte, de Minas Gerais, com previsão de entregar o reservatório entre o primeiro e segundo trimestre de 2021.

Outro problema resolvido depois de quase cinco anos: há uma semana, a Sanepar anunciou a assinatura de contrato com a agora denominada Nova Engevix para o Plano de Segurança da Barragem do Rio Miringuava, justamente para “restabelecer total segurança à estrutura” com apoio técnico e monitoramento da empresa, em atendimento às normas da Agência Nacional de Águas.

A obra deve resolver os problemas de falta de água na região Sul de Curitiba e municípios da região metropolitana, só que se já estivesse pronta conforme o planejado, a barragem hoje livraria a estatal e os consumidores dos atuais problemas, que não se sabe mais se acontecem só por causa da estiagem ou também pelo atraso das obras.

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