Druk discute alcoolismo como saída e não como fim

Novo filme de Thomas Vinterberg concorre ao Oscar com premissa para lá de sui generis

Com duas nomeações para o Oscar, Druk – Mais Uma Rodada, é um dos filmes mais interessantes do dinamarquês Thomas Vinterberg. A história parte de uma premissa estapafúrdia para construir uma crônica da sociedade contemporânea dinamarquesa, mas com toques bastante universais.

O excelente Mads Mikkelsen (que também colaborou com Vinterberg em A Caça) vive um professor de história em crise de meia idade. Casado e com filhos, sente que perdeu o viço característico da juventude. Outrora um professor amado pelos alunos, hoje suas aulas são entediantes. Até a sua esposa o considera um tanto enfadonho. É em uma reunião com amigos de adolescência, todos também professores da mesma escola, que ele fica sabendo da teoria de um psicólogo, que o ser humano precisa viver levemente embriagado. Algo como o aforismo cunhado pelo ator Humphrey Bogart, “a humanidade está sempre duas doses abaixo do normal”. A partir daí, o grupo inicia um experimento pseudocientífico e passa a beber todos os dias úteis das 8h às 20h.

De fato, os primeiros dias do experimento são um sucesso. Com mais álcool no sangue, os professores demonstram mais energia e mais carisma. O então sonolento professor de história passa a conseguir uma conexão magnética com seus estudantes, ajudando em sua autoestima.

Druk inicia com uma epígrafe que diz: “O que é a juventude? Um sonho. O que é o amor? O conteúdo do sonho”. Escrito pelo filósofo dinamarquês Soren Kiekegaard, o texto reverbera em cada sequência do longa-metragem. É justamente sobre a perda da juventude que Vinterberg fala e, consequentemente, do amor. É aí que entra o álcool, como catalisador das emoções e das relações sociais, característica da substância geralmente descoberta na adolescência e levada para a vida.

Há um monte de questões sendo debatidas em Druk, palavra que em dinamarquês significa “bebedeira”. A depressão, o vício, o abuso de drogas e a solidão são alguns dos aspectos presentes na obra. Mesmo assim, o filme não cai na tentação de dar lições de moral ou mesmo de julgar o uso (ou mesmo o abuso) de álcool. Ao contrário, um braço importante da discussão promovida aqui é a de que as substâncias entorpecentes têm papel central na humanidade para o bem e para o mal do desenvolvimento intelectual e sentimental.

Compatriota de seu colega mais famoso e mais ousado, Lars Von Trier, Vinterberg tem uma carreira extensa iniciada na década de 1990 dentro do Dogma 95. Na época, o manifesto deu o que falar quando os cineastas lançaram dez mandamentos para um cinema autoral e mais potente. Entres os dogmas, dizia-se que um filme precisava ser filmado com luz natural, sem tripés ou música incorporada na edição. Também pregava o não uso de armas e a ausência de dublês, mesmo que se tratasse de sexo explícito. Foi uma jogada de marketing que lançou a dupla ao estrelato dos festivais de cinema. E, de fato, resultou em um punhado de ótimos filmes, tal como Festa de Família, estreia em longa-metragem de Vinterberg.

Druk – Mais Uma Rodada

2020, FIC, 117min. Disponível para compra no Apple iTunes e no Google Play, para aluguel no Google Play e para assinantes no Net Now.


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