Projeto pretende iluminar áreas da periferia de Curitiba com sistema de energia inteligente

Painéis solares captam a radiação do sol de forma suficiente para abastecer os postes existentes nas ruas da vila e oferecer banho quente

O Projeto Solar – Sustentabilidade para Todos está instalando um sistema inteligente para clarear as ruas mal iluminadas de uma comunidade onde os moradores as percorrem a noite quase no escuro. Também está prevista a instalação de um sistema de aquecimento de água, para garantir o banho quente que as pessoas nem sempre encontram no interior de suas moradias.

Na sede da comunidade 29 de Março, na Cidade Industrial de Curitiba, foram instalados 17 painéis fotovoltaicos, que são capazes de gerar 8.250 quilowatts-hora ao ano. Além disso, estão previstos dois módulos térmicos e um reservatório de 800 litros. Eles assegurarão água com boa temperatura para quem utilizar o banheiro anexo, que é de uso comum. 

“Essa capacidade de geração de energia solar é bastante coisa. A vida útil do sistema será de 25 anos, garantida pelo fabricante, mas ainda pode durar mais”, explica um dos engenheiros eletricistas responsáveis pela implantação, Janio Gabriel.

A energia elétrica é produzida ali mesmo, em cima de uma cobertura construída sobre a sede onde a comunidade se organiza e promove atividades coletivas. Neste local já há computadores que agora passarão a ser alimentados com energia estável, minimizando danos aos equipamentos.

É importante ressaltar, que a energia gerada nas placas fotovoltaicas é conduzida para um aparelho chamado inversor, que a distribui de forma estável para 35 postes de luz espalhados nas vias da comunidade.

Desde junho de 2019, o Palácio 29 de Março, prédio da sede da prefeitura de Curitiba, tem energia gerada a partir de 439 painéis solares instalados no telhado. O investimento foi dividido entre o município e um programa de eficiência energética da Copel.

Na comunidade 29 de Março, o Projeto Solar ajuda a reduzir a distância de acesso às novas tecnologias, que normalmente não costumam estar ao alcance das populações carentes das periferias.

Placas solares foram instaladas no telhado da sede da comunidade 29 de Março e fornecerão energia para todos os 35 postes de luz da vila. Foto: Ambiens.

Redução da desigualdade climática

Este projeto está sendo implantado em Curitiba por conta de uma seleção prévia de duas capitais, Curitiba e Porto Alegre. Ambas atendem alguns pré-requisitos, como a assinatura do Pacto Global de Prefeitos pelo Clima e a Energia, a realização do Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa 2018 e do Plano de Ação Climática (PAC), e a existência de um Grupo de Trabalho Sobre o Clima, entre outros. Por outro lado, a proposta está alinhada com três dos pilares do PAC de Curitibar: Neutralidade de carbono; Ação climática inclusiva; e Governança climática.

Para isso, o projeto busca mitigar as mudanças climáticas com a redução da emissão de gases de efeito estufa (GEE), ao gerar e fazer uso de uma fonte limpa e renovável; com a promoção de uma ação inclusiva de uma comunidade vulnerável no contexto da utilização de energia solar; e com a divulgação pela internet da sua concepção tecnológica, seus resultados e contribuição social, e ainda ajudando na formulação de políticas públicas, engajamento social e consciência ambiental.

A coordenadora do projeto, Adriane Nunes Ferreira, da Ambiens, conta que o envolvimento das pessoas é fundamental. “Nós estamos trabalhando em uma área com séria vulnerabilidade social. Metade dos moradores faz parte de grupos minoritários como a população negra, mulheres, pessoas com deficiência e imigrantes. Trazer luz para esta comunidade é impactar diretamente a vida de mais de 220 famílias”, conta Ferreira.

Segundo o levantamento socioeconômico, realizado pela Ambiens em conjunto com a organização social TETO, a renda média per capita dos moradores da 29 de Março é de R$ 390 por mês, valor que, segundo o IBGE, é quatro vezes menor que a renda média mensal de um cidadão de Curitiba.

“Tinha lugar que a gente não enxergava nada”, conta Juliana Teixeira, liderança da comunidade. Depois da total implantação do sistema, a rotina noturna deve mudar. “Agora, a gente está achando que está em uma cidade chique, né?”.

Quem também viu a fase de testes foi Nayane Saraiva, que vive na comunidade desde 2017. Ela acha que a rotina noturna deve ficar mais segura. “Na calada da noite, a gente ficava com medo às vezes. Agora com a luz, para abrir o portão a rua vai ficar clara. Dá pra ver quem está aqui e quem está passando”.

Chuveiro comunitário é aquecido com sistema de energia inteligente do Projeto Solar. Foto: Ambiens.

Energia inteligente, menos carbono

A contagem de emissões evitadas e a geração de energia, assim como dados da população impactada, podem ser acompanhados por um Dashboard que será disponibilizado online no site da Ambiens. O sistema ainda é inteligente porque apresenta a linha Smart City (cidade inteligente, em inglês), em que a iluminação ocorre com maior intensidade em horários de maior uso, entre 20h e meia-noite, baixando a intensidade antes e após este período.

Na COP26, a maior conferência do clima da Organização das Nações Unidas, realizada este ano na Escócia, uma das principais discussões foi a redução de GEE pelos países, e a contribuição desta medida pelas cidades. Os sistemas do Projeto Solar vão cooperar consideravelmente para reduzir emissões.

“Utilizando os fatores de conversão dos últimos anos, o nosso projeto evita a emissão de até 1 tonelada de CO2 [dióxido de carbono] no período de um ano”, explica o engenheiro Gabriel. Essa é a quantidade de emissões que seriam lançadas na atmosfera caso a energia para iluminar todas as ruas do bairro fosse retirada do sistema convencional, que alterna energia de hidrelétricas e termelétricas.

Curitiba é hoje a cidade que mais emite GEE no Paraná. Segundo o sistema SEEG Municípios, que mede as emissões por cidade no Brasil, Curitiba emitiu 3,2 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2018, último ano de computação dos dados. O setor de energia está entre os primeiros responsáveis pelas emissões da capital do estado.

Combate à desigualdade climática

Ainda de acordo com Ferreira, o modelo é excelente para ser replicado em outros bairros. “Esse sistema pode atender comunidades de tamanhos diferentes, além da possibilidade de utilizar partes separadas dele, como só para aquecimento, ou só para iluminação, como for necessário”.

A Ambiens Sociedade Cooperativa, responsável pelo projeto, é uma organização sem fins lucrativos de Curitiba, fundada em 2000, que desenvolve trabalhos de planejamento territorial e socioambiental, além de atuar em projetos de impacto social e na área da educação. A Ambiens foi uma das quatro escolhidas entre várias organizações brasileiras para receber o financiamento do Action Fund Brasil, cujos recursos foram destinados ao Projeto Solar. O fundo vem da Google.org e é gerido pelo ICLEI – Governos Locais pela Sustentabilidade, para promover projetos sustentáveis.

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