Bolsonaro fez um discurso radical na ONU. Para certa imprensa, essa é a nova normalidade – não houve nada demais, dizem, apesar de o presidente ter dito que a ditadura, o golpe de estado e a tortura nos salvaram.
Evidente que isso não pode ser aceito. Mas, por outro lado, talvez tudo que os bolsonaristas queiram é a grita de quem ainda acredita na civilização. O horror da defesa dos direitos humanos. A lividez de quem ainda crê na decência.
A cada grito contra seu discurso, ele ganha um argumento: poderá dizer que está certo, que há mesmo uma esquerda radical e que só alguém como ele é capaz de pará-la.
A cada um de nós que rasgar as vestes e jogar cinzas sobre a cabeça ele triunfará – e se alguém disser que é preciso fazer algo contra ele, sairá duplamente de herói: é tão bom que os vilões pensam em detê-lo, em derrubá-lo.
Radicalismo à direita pode parecer uma ofensa para você, mas para os 57 milhões é um elogio, como ficou comprovado. Dar a Bolsonaro esse selo é necessário, mas isso isoladamente não tirará um voto dele em 2022. Pelo contrário.
Um Queiroz é muito mais prejudicial a Bolsonaro do que dez discursos estúpidos na ONU. É por isso que a exibição patética em Nova York se faz em público, e Queiroz esconde-se.
Uma mamata levando parentes em avião – isso sim pode tirar votos, e lembrar a existência disso sim pode ser prejudicial para o presidente. O toma lá dá cá para aprovar as reformas; a embaixada para o filho; é isso que a oposição precisa entender que deve jogar aos quatro ventos.
Enquanto fizermos a Bolsonaro o favor de prestar atenção mais a seus discursos do que a seus atos, estaremos fazendo campanha para ele. Os eleitores adorarão alguém que a civilização detesta.