Prisão de Renato Freitas expõe violência da Guarda e racismo latente da cidade

Truculência contra vereador faz pensar o que as autoridades andam fazendo longe dos holofotes

O caso da prisão do vereador Renato Freitas (PT) nesta sexta (23) em Curitiba é uma somatória de absurdos tão grande que fica difícil saber por onde começar. Talvez o jeito seja começar cronologicamente mesmo e ir apontando um a um os erros do aparato de segurança e das autoridades políticas.

1- Tudo começa com um protesto bastante mirrado em praça pública. Os vídeos mostram Renato Freitas com dois ou três gatos pingados gritando “Fora Bolsonaro”. Era só isso. A Guarda Municipal foi chamada porque um sujeito passou por ali, se apresentou como policial e disse que não era para ter protesto ali. Quando o vereador disse que tinha direito e continuou, houve alguma confusão. A versão de Renato é que ele foi agredido e para evitar uma pancada se defendeu colocando o megafone para proteger o corpo. O sujeito, porém, teria se cortado no megafone.

2- Alguém acionou a Guarda Municipal. Brotaram quatro viaturas no local em minutos. Se a segurança da cidade fosse sempre assim, hein? Um corte no rosto e aparecem, QUATRO viaturas instantaneamente. Parecia que o vereador era um agente da Al Qaeda oferecendo plutônio enriquecido em praça pública.

3- Renato Freitas continuou seu protesto e, mostram os vídeos, respondeu polidamente que tinha sido vítima de uma agressão. Os guardas insistem que ele vá com eles para a delegacia para registro do caso. Ele diz que não. Insistem de novo, como se fosse um flagrante (não era). Como se ele fosse obrigado a ir fazer um BO (não era).

4- Mesmo assim, Renato diz que iria. Mas que tinha que esperar duas pessoas de seu gabinete que já estavam chegando. Sem explicar por que, os guardas negaram. Aqui é importante registrar que Renato é autor de um projeto que exige câmeras monitorando o trabalho dos guardas municipais e exames toxicológicos regulares.

5- Um dos guardas começa a perguntar se Renato tinha AUTORIZAÇÃO para estar protestando. Explique-se: se você vai fazer uma passeata com mil pessoas e parar o trânsito, precisa fazer um registro na prefeitura. Para gritar “Fora Bolsonaro” com dois amigos na praça, não.

6- Do nada, e com uma truculência absurda, meia dúzia de guardas ataca Renato, derruba o vereador no chão e algema. Covardia, brutalidade e falta de técnica. Um deles põe o joelho nas costas do vereador. Depois, dizem que “amaciaram a queda” dele. Horror completo. Uma súmula do STF inclusive proíbe algemar pessoas, a não ser que haja risco para a vida ou integridade de alguém. O vereador estava desarmado.

7- Jogam o vereador num camburão. Ele reclama que estão roubando seu celular (veja: em tese ele ia denunciar uma agressão na delegacia! Era a possível vítima!) e o guarda, arrogante, diz que denúncia falsa de crime também é crime.

8- Antes de tratar Renato como criminoso, os guardas nem se deram ao trabalho de ouvir alguém, os comerciantes da região, as testemunhas. Nada.

9- Registre-se: embora advogado e vereador, Renato é preto. Usa cabelo afro. Estava com camiseta do MST.

10- Depois de todo o absurdo vir a público, os guardas publicam um vídeo que só confirma todo o horror, como se achassem que tudo aquilo que fizeram é natural. Dizem ter usado força moderada. Imagina se não houvesse moderação como seria.

11- O caso poderia ser exemplar. Pense: o prefeito vai a público e diz que isso é inaceitável. Pune exemplarmente os envolvidos. Provavelmente isso teria efeito sobre a atuação da guarda em casos com menor visibilidade (afinal, se agem assim com um vereador no centro da cidade, imagine o que fazem nas quebradas). Mas Greca se calou. Apareceu neste sábado pela manhã nas redes sociais comendo rollmops.

12- A Câmara Municipal, tão dada a corporativismos em outros casos, como por exemplo quando livra seus pares de punições, nem uma nota emitiu. Todos no silente eloquente que sempre margeia casos de violência e racismo nas grandes cidades brasileiras.

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