Conselho de Direitos Humanos fala em “linchamento moral” de Renato Freitas

Vereador participou de protesto contra assassinato de negros na Igreja do Rosário

O Conselho Permanente dos Direitos Humanos do Estado do Paraná (Coped) emitiu uma nota nesta sexta-feira criticando oque chamou de “linchamento moral”! dos participantes de uma manifestação dentro da Igreja do Rosário.

A manifestação, convocada pelo Núcleo Periférico, lembrava dois assassinatos de homens negros ocorridos dias antes. Um deles, do congolês Moïse Kabagambe; o outro, o brasileiro Durval Teófilo Filho. Os manifestantes marcaram o protesto para a frente da Igreja do Rosário pelo valor simbólico do local – a igreja foi erguida em 1737 por escravos negros. Depois de terminada a missa, o grupo entrou no local, estendeu faixas e gritou palavras de ordem.

Segundo a nota do conselho, “não é de hoje que o assassinato da população negra é banalizado”, e os manifestantes que ocuparam a igreja teriam sido criminalizados.

É, neste contexto, que manifestamos a preocupação com a aligeirada criminalização dos atos dos manifestantes durante o protesto ao adentrarem a Igreja do Rosário dos Pretos. Um espaço que historicamente foi construído por homens e mulheres negros, para manifestar a sua fé e encontrar conforto para dor que sentiam com a escravização de seus corpos e com o racismo presente tecido social.

Quem está sofrendo as principais consequências pelo protesto é o vereador Renato Freitas, do PT, que participou do ato dentro da igreja e que por isso teve pedida a cassação de seu mandato.

Leia na íntegra a nota do Coped:

O CONSELHO PERMANENTE DOS DIREITOS HUMANOS DO ESTADO DO PARANÁ (COPED) cumprindo sua principal atribuição de proteção dos direitos humanos e da cidadania, vem, por meio desta nota, manifestar-se publicamente sobre os fatos ocorridos no último dia 5 de fevereiro de 2022, quando se realizava um ato no Largo da Ordem, na cidade de Curitiba – PR, que manifestava revolta aos assassinatos de dois homens negros no Estado do Rio de Janeiro.

O protesto, organizado pela sociedade civil, visou o pedido de justiça em face do brutal assassinato do congolês Moïse Kabagambe e do ainda mais flagrante racismo que foi a morte à tiros, por um vizinho, do brasileiro Durval Teófilo Filho.

Não é de hoje que o assassinato da população negra é banalizado como um dos efeitos do racismo no Brasil. O Racismo estrutural como um conjunto de atos e práticas históricas, institucionais, interpessoais que afeta população negra, normaliza a barbárie e é uma ferida ainda exposta em nosso cotidiano e na sociedade paranaense.

É, neste contexto, que manifestamos a preocupação com a aligeirada criminalização dos atos dos manifestantes durante o protesto ao adentrarem a Igreja do Rosário dos Pretos. Um espaço que historicamente foi construído por homens e mulheres negros, para manifestar a sua fé e encontrar conforto para dor que sentiam com a escravização de seus corpos e com o racismo presente tecido social.

Pelas informações veiculadas na última terça-feira, dia 8 de fevereiro, pelo Padre Luiz Hass, responsável pela Igreja no horário dos fatos, que após a missa, foi até a porta verificar o protesto. Logo após, os manifestantes entraram por uma porta lateral e “não destruíram nada, não sujaram”. Nas

imagens fartamente divulgadas nas redes sociais, aparenta não haver qualquer cena de violência física ou verbal, o que deve ser comprovado nas investigações em andamento.

No entanto, nos causou espanto o linchamento moral incentivado por autoridades públicas, na imputação de crime a apenas uma autoridade presente no ato, o vereador Renato Freitas Se não havia mais qualquer cerimônia religiosa, se não houve violência, não há crime. Peças ilações injuriosas, ao que se aponta, nos faz inferir que escolheram mais um corpo negro para criminalizar, em detrimento de outros tantos que também adentraram no interior da Igreja dos Pretos.

De igual modo, considerando que um dos efeitos da discriminação racial no Brasil é culpabilização a priori de determinados grupos quando se manifestam pelo direito a vida e proteção a sua dignidade, é repugnante os atos criminosos de racismo pela mera presença da vereadora Carol Dartora à manifestação no Largo da Ordem.

Este Conselho, ciente de seu papel dentro da estrutura do Estado do Paraná, consciente do papel da Igreja Católica na pacificação de conflitos, da responsabilidade necessária às autoridades públicas, clamamos à toda sociedade paranaense que reconheçam nos fatos um chamado ao respeito mútuo e um permanente diálogo a fim de compreensão das contradições sociais.

Por fim, solicita o COPED que todas as instituições responsáveis por investigar e julgar as pessoas envolvidas nos fatos não incorram na prática do racismo epistêmico – sobretudo, na sua modalidade de “injustiça testemunhal”, conforme sustenta o jurista Adilson Moreira -, o que leva com frequência as autoridades públicas a considerarem menos legítimo o testemunho e a versão apresentada por pessoas negras. Portanto, requer que sejam ouvidas com consideração e respeito às e os envolvidos no ato.

Conselho Permanente dos Direitos Humanos do Paraná. Curitiba, 15 de fevereiro de 2022.

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