Começam caçando livros; terminam indo à caça de pessoas

Os vilões do neoconservadorismo pentecostal brasileiro são os gays

O caso da Bienal do Rio, com o prefeito-bispo Marcelo Crivella se prestando ao papel de censor de revistas em quadrinhos, causou o choque devido no país. Ou pelo menos na parte do país que se choca com a censura: há uma porção considerável que, como Crivella, se choca é com o beijo.

Embora para o leitor instruído, para o eleitor progressista, para boa parte de nossas bolhas de Facebook tenha parecido que a resposta ao bispo da Universal foi bem dada e necessária, tudo leva a crer que para muita gente Crivella é o herói que quer livrar nossos filhos de um problema.

Pense em quem se elegeu em 2016, nas capitais. Pense em quem se elegeu para os governos em 2018. Pense no discurso que levou Jair Bolsonaro á Presidência. Ser homófobo, no Brasil, dá votos.

É sabido que para a criação de um herói precisa-se, antes de mais nada, criar um vilão. Os vilões do neoconservadorismo pentecostal brasileiro são os gays – e junto com eles a universidade, a imprensa e as artes que, segundo essa visão, desvirtuam valores.

O problema maior do que ocorreu na Bienal, e do que vem acontecendo na perseguição à arte que faz referência à homossexualidade em geral não é “só” o que isso traz de prejuízo às artes. É a demonização das pessoas representadas nessa arte.

A justificativa para a caça ao beijo gay era que isso é um comportamento indigno, que não deve ser visto por crianças. Comparou-se um beijo a pornografia. Um carinho comum, se feito pelas pessoas erradas, é pornográfico, aviltante, e deve ser retirado da vista de inocentes.

O problema é que se começa considerando que indesejada é a arte; mas termina-se chegando à conclusão de que as pessoas que têm aquele comportamento na vida real são igualmente indesejadas.

E assim como se vai à caça de livros, em seguida vai-se à caça de pessoas. Nós sabemos como isso termina.

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