Uma mãe, uma louca, um fracassado e três suicidas

Bia Moraes fala do cinema de Darren Aronofsky

Falar dos filmes de Darren Aronofsky é um pesadelo. Variam como sonhos doentios. Vou falar apenas de três: Cisne Negro, O Lutador e Mãe. Eu sei: nenhum é dirigido nem escrito por mulheres. Mas são meus longas favoritos deste homem.

Todos têm várias camadas, por isso que eu os aprecio. Dá para ver, rever, trever. Poderia falar de Réquiem para um Sonho, eu gosto também; mas depois ele foi apurando o estilo, que combina violência e piração com um subtexto dramático e até assustador. Como os contos que eu mais gosto, e como os que eu estou tentando escrever.

O diretor tem uma característica. A câmera sempre acompanha o protagonista por trás. Em O Lutador é ainda mais evidente. É como se ele dissesse: você é ela, ou ele.

Cisne Negro é sobre uma mulher que fica louca. Por competição. Lembra alguma coisa da nossa sociedade, não é? Ela foi criada por uma mãe que teve a carreira frustrada. Então ela tem que ser a melhor do balé clássico. A número um. A prima ballerina. Não sai à noite, é virgem, não bebe e também não come. A número dois do corpo de baile fica amiga dela e transa com o coreógrafo. Aí ela pira mesmo. Tudo combinado com o balé Cisne Negro, até o final apoteótico.

Natalie Portman, em Cisne Negro. Crédito da foto: divulgação.

O Lutador é sobre pessoas fracassadas, porque são velhas, passadas da idade, pobres. Magnificamente vivido por Mickey Rourke, ele mesmo um ex-boxeador amador, que amassou a cara a ponto de fazer plásticas horríveis. Foi-se o rosto de galã. Mas tudo bem. Quem ainda liga prum rostinho bonito? 

A trajetória dele é tão triste, mas contada de uma forma tão comovente, que eu não sei se choro ou se sinto um calor no coração ou as duas coisas juntas.
E tem Marisa Tomei incrível no papel de uma dançarina de striptease perto dos quarenta. Ela tem um corpo incrível, mas já não consegue ganhar tanto dinheiro dos rapazes, que falam que ela poderia ser a mãe deles.

Mickey Rourke, em O Lutador. Crédito da foto: divulgação.

É New Jersey, é frio, tudo é pobre, Rourke oxigena o cabelo comprido num salão de bairro, faz bronzeamento artificial, usa aparelho para surdez, é solitário, mora num trailer, gosta de rock pesado dos 80’s, toma boletas e bombas de um segurança que também é traficante, e faz luta-livre (igual ao nosso antigo telecatch). Tudo é pré-combinado, e cada lutador tem um personagem. Mas as porradas são reais, ele está velho e sofre do coração, embora seja uma lenda desse estilo de luta. O final é uma surpresa.

E finalmente Mãe. Eu sei: tem várias interpretações. Tem muita gente que viu a história da Bíblia. Eu assisti três vezes e não consegui ver isso. O que eu vi: a mãe é a casa (bom, o poeta fala isso para ela no final). Mas eu vi também que é um artista com a sua criação. Quando ele finalmente se inspira, depois de engravidar a mãe, e escreve, tudo que ele faz é autodestrutivo, para que se inspire de novo e mais uma vez e de novo.
Ou seja, toda criação necessita ser destruída, para que outra criação completamente nova seja construída.

Javier Bardem e Jennifer Lawrence estão em Mãe. Crédito da foto: divulgação.

Eu não gostei de Javier Bardem nem de Jennifer Lawrence. Nem de Natalie Portman, a bailarina. Aliás: eu não gosto deles. Não vou com a fuça de nenhum. Mas não impede de os filmes serem muito bons. Na verdade, até contribui para isso. Dá um estranhamento que eu curto.

O melhor dos três? O Lutador. E viva Mickey Rourke.

Para ir além
Mãe e Cisne Negro: Telecine Play.

O Lutador: Amazon Prime.

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