No último mês, iniciei uma série de entrevistas com profissionais da arte a fim de sanar algumas dúvidas e curiosidades sobre o universo das exposições. Afinal, muitos colegas me perguntam como acontece uma exposição, quem são os profissionais envolvidos e quanto tempo leva todo o processo. É importante lembrar que, antes de ter a exposição pronta, há uma grande equipe de especialistas envolvidos.
Por este motivo, o segundo profissional que entrevistei tem a função de organizar a parte financeira e burocrática, bem como planejar e supervisionar todas as etapas, desde a viabilização – busca por investidores ou editais – até a desmontagem da exposição. O(a) produtor(a) cultural garante o bom andamento de um projeto e a articulação entre os diversos profissionais que atuam na exposição.
Para esclarecer um pouco mais sobre a produção de arte, conversei com a produtora cultural Rebeca Gavião Pinheiro.
Quero saber um pouco mais de você. Quando você começou a trabalhar com produção e como foi esse processo?
Rebeca Gavião Pinheiro: Eu sou formada em Administração de Empresas na [Universidade] Positivo. Logo que me formei, fui morar fora na Califórnia, fiz um curso em Marketing. Fiquei lá um ano e meio, voltei e comecei a trabalhar no Museu Oscar Niemeyer. Eu não tinha ligação nenhuma com arte. Gostava, mas não tinha nenhuma experiência, apenas curiosidade e vontade de aprender.
Entrei no MON bem no começo quando a Maristela Requião assumiu, em 2003. Comecei a trabalhar junto com a Sandra Fogagnoli, que já tinha uma experiência bem grande nessa área de produção de exposição, porque ela veio da Fundação Cultural [de Curitiba]. Comecei a trabalhar lá desde a implementação do Museu, fazendo o contato com os artistas, com os curadores, no calendário das exposições, fazendo orçamentos de transporte e seguro, expografia. Fiquei no MON durante aproximadamente dez anos, num cargo que antes era mais de assistente, depois assumi ao lado da Sandra [Fogagnoli], a qual foi minha professora nessa área, toda a produção e planejamento cultural. A equipe era restrita, mas chegamos a abrir, mais ou menos, vinte exposições ao ano, entre exposições nacionais e internacionais.
Foi um período muito bom de aprendizados, relacionamentos e muita experiência. Depois de 10 anos, resolvi sair. Realmente eu tinha aprendido bastante coisa e abri uma produtora de artes visuais. Só de artes visuais, não trabalho com teatro e nem com audiovisual. Com a empresa já aberta fui convidada pela Diretora do MAC para assumir a produção do Salão Paranaense. Nisso fiz três Salões Paranaenses – o sexagésimo quarto, quinto e sexto. Também fiz a produção do 4.º e 5.º Salão Nacional de Cerâmica para o Museu Alfredo Andersen, sempre nessa questão de produção. E a organização das exposições ficava por minha conta.
Além disso, em 2010 fiz uma especialização em Bens Culturais, Cultura, Economia e Gestão, na FGV (Fundação Getúlio Vargas). E nisso foram surgindo vários trabalhos, no MON e em outros. Até alguns trabalhos fora, como em Salvador, São Paulo. Com isso, comecei a fazer trabalhos de colocar projetos na lei de incentivo, tanto federal, quanto estadual (PROFICE) e municipal. E comecei a pegar gosto pela coisa.
Resumidamente, como você definiria o que você faz? O que faz um produtor?
Eu acho que o produtor fica no backstage, ele não aparece muito, porque realmente as pessoas chegam e veem a exposição pronta, “nossa, está pronta a exposição, que linda”. Mas não sabem todo o caminho que foi percorrido para chegar até aquela exposição ali pronta.
Isso significa lidar com dinheiro, cronogramas, contratos, pessoal e todas as outras tarefas menos glamorosas – mas absolutamente essenciais – para que as coisas fluam de uma maneira mais tranquila. O produtor é quem organiza toda essa cadeia. Na verdade, para chegar no resultado da exposição, é um trabalho colaborativo entre vários profissionais: o artista, o curador, o arquiteto, o crítico, quem faz o projeto de iluminação, etc. O produtor é o que coloca ordem na coisa, ele vai analisando tudo. Resumidamente, é isso, produtor é a peça-chave, mas a peça que não aparece.
E ele é importante desde a concepção até montagem da exposição…
Desde o começo, o produtor é que faz contato com o curador e o artista, faz essa ponte, faz todos os orçamentos, coloca o projeto na lei de incentivo, ele faz a prestação de contas. Até na abertura da exposição ele está ali coordenando todos esses leques que abrem para ser o resultado final que é a exposição, para que o objetivo do projeto, da mostra, seja alcançado.
E até a desmontagem mesmo…
A desmontagem também. A manutenção da exposição, a parte educativa que é bem importante, a desmontagem e toda a prestação de contas. Afinal, tem que prestar contas para o patrocinador, para o edital que foi aprovado, e para a própria instituição que recebeu a mostra. Então é bem complexo.
A responsabilidade é bem grande. Uma pergunta mais abrangente que eu fiz também ao curador – quanto supostamente começa e termina uma exposição? Porque o visitante tem uma data, mas começa muito antes e termina depois.
Para começar a pensar na exposição, no mínimo, um ano antes. Um ano antes já estamos trabalhando com o curador, que tem de fazer a escolha das obras, pensar na trajetória da exposição, o que ele quer abranger naquilo, qual o resultado a ser alcançado. Também para a escolha das obras, para o contato com os artistas ou com as famílias dos artistas, no caso do artista não estar vivo mais… Começa pelo menos um ano antes e terminamos uns seis meses depois, caso tenha um catálogo e também para fazer o registro da exposição. É um período bem grande de trabalho.
Pode-se dizer que há uma metodologia de trabalho, quase como um passo-a-passo ou varia muito de exposição para exposição?
Varia muito. Mas o passo-a-passo é o contato com o curador, do curador com o artista, a escolha das obras. Depois vem o projeto expográfico, o projeto de iluminação. Neste tempo é necessário colocar a exposição na lei, falar com a instituição que vai receber a exposição, e então começamos a montagem da exposição, a manutenção, a desmontagem.
E a produção conversa com todo mundo, com todos os profissionais envolvidos na exposição, certo?
Conversa com todo mundo! Conversa com o curador, com o artista, com o arquiteto, com o assistente de curadoria, com o programador visual da sala, com o diagramador que vai fazer o catálogo, com a pessoa do educativo, com a pessoa que vai fazer o projeto de iluminação, com os montadores, com os fornecedores de material expográfico que vão executar esse projeto. Com todos esses profissionais envolvidos.
Quais são as funções de um produtor? Eu acho que você já resumiu quando disse o que faz um produtor, que tem muito a ver com a organização. O que é de sua responsabilidade em uma produção e o que não é?
Eu acho que é de minha responsabilidade fazer toda a organização, fazer com que todos esses agentes envolvidos tenham um bom relacionamento. Ter uma boa ligação, uma comunicação fácil.
O que não é de responsabilidade do produtor é a escolha das obras, o lado criativo, o projeto expográfico, o projeto de iluminação… mas ele tem que estar atento para todo mundo estar em sintonia e também os custos para realização. Eu acho que o produtor tem muita responsabilidade, mas a escolha das obras, por exemplo, é o curador.
O produtor tem certa autonomia de trabalho ou depende muito da instituição para tomar algumas decisões? Às vezes acontecem uns percalços no meio do caminho…
Ele tem autonomia se o projeto está no nome dele, se ele é o responsável, coordenador do projeto, ele tem autonomia sim. Mas sempre conversando com esses agentes, nunca impondo nada de fato, mas sempre conversando para ter uma boa relação, para a exposição não ter nenhum gap e nenhum mal-estar entre todos os agentes que trabalham. Quando é uma instituição, você vai respeitar, falar com a instituição, “posso fazer isso, posso fazer aquilo, me autorizam a fazer essa parede, colocar esse tipo de iluminação?”. Sempre respeitando a instituição e os demais profissionais envolvidos no projeto.
O que você diria para um(a) jovem produtor(a) que está começando a trabalhar e trilhar esse caminho?
Paciência [risos], bastante paciência e comunicação. Comunicação é a peça-chave de um produtor. É muito importante deixar as coisas bem claras para todo mundo com quem você está trabalhando junto. Mas é muito satisfatório, prazeroso ver a exposição pronta! Difundir a arte e cultura para vários públicos.
Sobre o/a autor/a
Gabriela Koentopp
Arquiteta e urbanista pela UFPR e mestranda pelo IAU-USP, concentra suas pesquisas na área de Arte, Cidade e Cultura. Fundadora do Studio Mees, atuou em exposições no MON, MAC-PR e Maria Antonia-USP.