“Vacina chinesa” é ótima notícia para o Brasil

Há bons motivos para comemorar o início da vacinação, inclusive o uso da "vacina chinesa" que virou esperança concreta para o país

Depois de ter conduzido uma negociação desastrosa com a Pfizer, não ter conseguido concretizar a compra de um primeiro lote de vacina da AstraZeneca e de barrar a produção no Brasil da Sputnik, da Rússia, o governo federal se viu obrigado a aceitar que a vacinação nacional irá começar mesmo com a Coronavac, cujo principal representante no país é o governador de São Paulo – e desafeto do presidente Jair Bolsonaro – João Dória.

Isso não coloca fim na briga política entre Brasília e São Paulo. Nem garante um caminho tranquilo para a vacinação dos brasileiros contra a Covid-19. Mas é uma excelente notícia.

Entre as opções de vacinas que poderiam ser aplicadas no país, a Coronavac parece ser, de acordo com sua documentação técnica, não só eficaz, mas adequada à realidade do país.

A Coronavac é uma vacina feita a partir de uma tecnologia já estabelecida, de vírus inativado. Uma tecnologia já usada em outras vacinas produzidas no país. Além disso, manipulação das doses exige refrigeração em temperaturas compatíveis com freezers normais. Cada dose do imunizante – que exige duas com intervalo de 14 a 28 dias – custará US$ 10,30 (ou R$ 55).

É uma opção muito mais barata e mais fácil de manipular que, por exemplo, a vacina da Pfizer, cujo armazenamento precisa ser feito a -70C. A dose da vacina da Pfizer também é mais cara, cerca de US$ 20 (ou R$ 100). Num país como o nosso que tem enfrentado apagões e tem sérios problemas de logística no interior e no Norte (justamente onde está a situação mais crítica), seria uma opção arriscada.

Claro, também tem o grande problema do governo brasileiro não ter negociado a compra da vacina já em meados de 2020, como fizeram outros países. Mesmo que um acordo seja celebrado agora é provável que as doses compradas só sejam entregues no fim de 2021.

Muito embora ainda não se saiba quando o Butantan será capaz de produzir a vacina sem depender de matéria-prima da China, o instituto já fabrica imunizante semelhante e está com a estrutura preparada. No momento, o instituto aguarda a liberação de um novo lote de matéria-prima na China para poder continuar a produção no Brasil.

Comparada com a vacina da AstraZeneca, a Coronavac parece estar se beneficiando de um acordo mais bem estruturado do Butantan com a Sinovac, empresa chinesa que desenvolveu o produto. A AstraZeneca tem um acordo com a Fiocruz cujos detalhes não parecem estar muito certos.

Era dentro deste acordo que o governo brasileiro iria buscar dois milhões de doses na Índia, o que acabou sendo frustrado pelo governo de lá, que não quer exportar o imunizante quando está só no começo da vacinação de sua população.

A grande promessa da AstraZeneca, que é uma vacina feita a partir de um vírus geneticamente modificado, é ter doses mais baratas. A previsão é que cada uma custe, no Brasil, R$ 12. É preciso também uma segunda dose, o que faz todo o ciclo vacinal custar menos que a primeira dose de Coronavac. Será uma ótima opção quando o acordo AstraZeneca/Fiocruz finalmente andar.

O preço, é claro, é quesito fundamental num país que afunda numa crise econômica sem precedentes e que precisa vacinar pelo menos 120 milhões de pessoas, considerando os públicos prioritários (profissionais de saúde, pessoas acima de 64 anos, doentes graves, deficientes, indígenas, trabalhadores essenciais da segurança, educação, limpeza pública e varejo).

Mas a disponibilidade rápida também é essencial. E é nisso que o Instituto Butantan e o governo de São Paulo acertaram. Ao contrário do governo do Paraná, que ensaiou uma parceria frustrada com a Rússia, São Paulo conseguiu na iniciativa privada os investimentos que permitiram ao Butantan conduzir sua parte do trabalho e preparar o parque fabril necessário para a produção.

O maior obstáculo, além da produção, é romper o mar de desinformação derramado pelo próprio governo federal e seus apoiadores. Chamada pejorativamente de “vacina chinesa”, a Coronavac enfrentará a ignorância em seu estado puro. Um país que já erradicou doenças graças, a cobertura vacinal terá que novamente educar seu povo.

Agora é torcer para que não existam mais empecilhos desnecessários no caminho. E continuar a usar máscara, fazer distanciamento social e evitar aglomerações porque a estrada será longa, mas já há uma luz no fim do túnel.

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