Por um mundo do trabalho mais colorido

Os números mostram o quanto precisamos realmente de evolução, porque confirmam a realidade excludente no campo da empregabilidade e das oportunidades reais de crescimento profissional

O debate sobre diversidade e inclusão, especialmente neste momento de duelo de opiniões em que vivemos, vem ganhando força e avançando para além do discurso e das crenças sociais, religiosas e políticas que rodeiam o tema. Isso é consequência da compreensão de que, sem ações efetivas, o discurso não ultrapassa a barreira das ideias, sendo apenas um conjunto de palavras soltas, que não fortalecem a vivacidade das cores do arco-íris e nem a luta que a bandeira da diversidade carrega. 

Muito se fala sobre a necessidade de inclusão daqueles que historicamente estão à margem dos direitos fundamentais e sobre a naturalidade com que deveríamos agir perante as nossas diferenças. Porém, a compreensão da sociedade está carente do principal elemento que nos identifica: a humanidade, o que impacta diretamente o indivíduo como ser social e como ser produtivo, ou seja, quem somos e o trabalho que desenvolvemos.

Considerando essa carência e a necessidade de ruptura com o modelo excludente, falemos, então, sobre a dificuldade que ainda enfrentamos em vencer o grande reino intransponível de cultura sexista chamado “mercado de trabalho heterocisnormativo”. Em primeira análise, é fato que evoluímos muito no campo da inclusão após o processo de redemocratização do Brasil, mas não o bastante para que esta reflexão não se faça necessária.

Pois bem, os debates sobre o tema “diversidade e inclusão no mercado de trabalho” têm ganhado ainda mais corpo em virtude da resposta do mercado financeiro, que, com o impactante resultado das Bolsas de Valores mais importantes do mundo, sinalizou que o ambiente de trabalho diverso é altamente rentável. E, neste sentido, caminha a Bolsa de Valores de Nova Iorque e, também, a B3, com todos os seus novos índices relacionados às ações efetivas de inclusão. Assim, quem não evoluir, talvez não sobreviva no mercado.

Os números mostram o quanto precisamos realmente de evolução, porque confirmam a realidade excludente no campo da empregabilidade e das oportunidades reais de crescimento profissional. Um relatório recentemente elaborado pela Nodos Consultoria e Integra Diversidade mostra que o cenário da América Latina é bastante preocupante, pois 56,7% dos residentes com trabalho no último ano são homens, 29% são mulheres, enquanto apenas 6,9% são pessoas trans. Este é o retrato da quase absoluta exclusão dessas pessoas no mercado de trabalho. Com isso, todos nós perdemos. Basta pensar em quantas criativas ideias e inteligentes mentes deixamos de acessar em virtude de um banimento social que põe à vitrine a nossa incapacidade de quebrar paradigmas, de olhar o próximo e de amar.

O mercado de trabalho inclusivo revela uma relação direta de ganha-ganha, na medida em que equipes que contam com diversidade e escuta são capazes de gerar inúmeros benefícios, sobretudo na tomada de decisões. O histórico de vida de cada indivíduo faz com que as suas reflexões sejam únicas, viabilizando o cruzamento de percepções, perfis e experiências múltiplas, que resultam em decisões mais criativas, modernas e inteligentes. E é nestesentido que o relatório da Dayforce – Diversidade Importa (2020) aponta, indicando que as empresas que se comprometem a diversificar seus quadros de funcionários em relação a gênero têm resultados 15% superiores àquelas que não adotam a inclusão.

Foto: Pexels.

Mas o debate vai muito além destas ou daquelas poucas palavras e é na prática que os empregadores precisam mostrar a sua responsabilidade social como um dos suportes para a efetiva mudança em prol da diversidade, sendo o único meio de se enquadrarem nos índices econômicos que elevam o seu valor no mercado financeiro.

Como muito bem expõe Hannah Arendt, em seu célebre A Condição Humana: “O poder só é efetivado onde a palavra e o ato não se divorciam, onde as palavras não são vazias e os atos não são brutais, onde as palavras não são empregadas para velar intenções, mas para desvelar realidades, e os atos não são usados para violar e destruir, mas para estabelecer relações e criar novas realidades.” Esse é o dever do empregador ao preparar o seu microcosmos para uma diversidade real e não apenas proforma.

A gestão de capital humano inclusiva, consciente e que abrace o LGBTQIA (e mais todas quantas letras forem necessárias) é um trabalho grandioso em suor e alma, que demanda uma mudança de mentalidade para garantir um ambiente de trabalho saudável e seguro, com o compromisso de equidade nas oportunidades, no contracheque e na mesa decisória. É naturalizar e entender a riqueza de trabalhar em um ambiente multicolorido; é dar o direito ao profissional de ir ao banheiro que lhe cabe como indivíduo; é reconhecer o profissional sem exigências de enquadramento em um rigor estético e visual que o descaracteriza em sua identidade; é contar com um conselho comprometido e diverso capaz de ensinar na prática que gênero ou orientação sexual não estão associados a talento, inteligência e, muito menos, a caráter ou responsabilidade.

Mas não há receita e cada empregador precisa fazer a sua autoavaliação para entender, dentro da sua atividade econômica e de suas necessidades, qual é o caminho, consciente de que essa jornada sempre se inicia com a educação. E àqueles que ainda não compreenderam que um mundo plural é mais belo, cabe perceber que esse universo é também mais rentável e, como disse Paulo Leminski, “isso de ser exatamente o que se é, ainda vai nos levar além”.

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