Mineração de terras indígenas – genocídio anunciado

Impor a mineração em áreas indígenas, quando eles já manifestaram inúmeras vezes que não desejam, é um atentado aos seus direitos constitucionais

Orlando Villas Bôas (1914-2002), um dos grandes indigenistas que o Brasil conheceu, entendia da alma indígena. Em suas andanças pelo sertão brasileiro em contínuo contato com esses povos por mais de meio século, em uma de suas frases lapidares disse “se acharmos que nosso objetivo aqui, na nossa rápida passagem pela terra, é acumular riquezas materiais, pouco temos a aprender como os indígenas. Mas se acreditarmos que o ideal é o equilíbrio do homem com a natureza, sua comunidade e a família, então os indígenas têm lições extraordinárias para nos dar”.

Lamentavelmente o governo Bolsonaro, o qual nunca mostrou simpatia pela causa e pelos indígenas, resolveu praticar mais um atentado aos direitos dessa população tradicional, deseja que as áreas indígenas sejam objeto de exploração mineral, pretende impor um modo de vida não desejado por eles próprios. Através de um raciocínio tosco, agressivo e preconceituoso, alardeia, como se verdade fosse, que os indígenas almejam viver tal qual a nossa sociedade envolvente, numa autêntica economia de mercado, passando a serem empreendedores do mercado neoliberal.

O modo de viver dos nossos irmãos indígenas é diferentes da nossa sociedade envolvente: eles vivem sobre o tempo, nós sob o tempo; o nível de angústia é muitíssimo menor que o nosso; a liberdade faz parte do seu agir; a morte é apenas umas passagem para um outro mundo; o equilíbrio está na simplicidade, no silêncio e reflexão; o idoso passa horas em silêncio, pensando, ele e o seu Eu, sem angústia; poderia elencar outras percepções, mas ficará para uma próxima oportunidade e não neste compacto texto.

Impor a mineração em áreas indígenas, quando eles já manifestaram inúmeras vezes que não desejam, é um atentado aos seus direitos constitucionais, entre eles o respeito à cultura, tradição, língua, territorialidade e organização. A mineração, se autorizada, atingirá etnias e comunidades que possuem pouco ou nenhum contato com a nossa sociedade. Essa prática poluirá os rios, os peixes morrerão – principal fonte de alimentos para muitas aldeias –, o desmatamento aumentará, a fauna destruída, os costumes abruptamente alterados, novas doenças surgirão sem as imunidades adequadas, bebidas e drogas ilícitas percorrerão as aldeias, enfim, um genocídio anunciado.

Cabe somente aos indígenas escolherem quais costumes que gostariam de recepcionar de nossa sociedade, e o farão quando e como quiserem, isto se desejarem. O inaceitável é o Governo atual querer impor a eles desejos que não são deles. Que bom se o Governo atual concatenasse mais com os ensinamentos do grande sertanista e humanista marechal Cândido Rondon (1865-1958), o qual proferiu uma das mais impactantes frases no contato que ele fez com indígenas isolados no final do séc. XIX e XX “ao adentrar nas terras dos indígenas, morrer se necessário, matar nunca”.

Bolsonaro e sua equipe não devem seguir as atitudes do coronel Armstrong Custer (1839-1876), um dos maiores assassinos de indígenas dos Estados Unidos, e sim as ideias do nosso grande Rondon e tantos outros sertanistas e indigenistas.

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