A privacidade em seu sentido atual

Faz-se necessário ressignificar a privacidade que condiga mais verdadeiramente com essa sociedade na qual as pessoas estão hoje imersas

Até poucas décadas atrás, tinha-se a privacidade como sendo um direito de ser deixado em paz, sozinho, de lado. Falava-se bastante em vida privada, em intimidade, de forma a evitar com que as pessoas fossem simplesmente expostas, fosse pelo bem, fosse pelo mal, mediante a publicização de informações particulares que lhes eram tidas como reservadas e confidenciais frente aos olhos julgadores das sociedades mais antiquadas.

Todavia, ainda que essas preocupações, em especial as expositivas e as vexatórias, não tenham perdido protagonismo nos tempos de hoje, é razoável dizer que aquela velha noção de privacidade ainda é o suficiente para a realidade social contemporânea?

Sabe-se que a sociedade é, hoje, a da informação. As pessoas se encontram imersas em um mar de conhecimento fragmentado em dados de origem e de destinação desconhecidas, espalhadas em um sem número de ambientes de diferentes naturezas, sejam eles físicos ou virtuais, sejam eles públicos ou privados.

Espera-se, por essa razão, que as pessoas tenham suas informações publicizadas e instrumentalizadas sem que sequer tenham ciência disso, tamanha imersão, fragmentação e obscurantismo envolvendo os dados que, não raras as vezes, nem se sabe como, onde, por quem e do por que foram coletados.

Ser deixado de lado, dessa maneira, não é mais o suficiente em se tratando de privacidade. Muito pelo contrário, não é mais desejável estar sozinho se cercado por uma sociedade conectada na qual dados transitam de forma caótica e irrestrita.

Faz-se necessário, logo, ressignificar a privacidade que condiga mais verdadeiramente com essa sociedade na qual as pessoas estão hoje imersas.

Ainda mais com a quantidade significativa de legislações novas por meio das quais se pretende maior proteção da privacidade das pessoas, como a Lei do Cadastro Positivo (n.° 12.414/2011), o Marco Civil da Internet (n.° 12.965/2014) e a própria Lei Geral de Proteção de Dados (n.° 13.709/2018).

Em assim sendo, para que fossem de fato instrumentalizadas as referidas legislações em busca da efetiva proteção que delas se espera, passou-se a entender a privacidade como o direito da pessoa em manter controle sobre os seus dados pessoais em meio ao tráfego de informações de maneira demasiada e espontânea.

Deixa-se, assim, de restringir a privacidade pela esfera privada da pessoa, posta a dificuldade desta em se manter anônima diante de tantos meios de exposição informacional, a fim de que, sabendo-se disso, seja a ela conferida ao menos uma autodeterminação informativa por meio do maior controle dos seus dados.

Até por isso que as legislações mencionadas não objetivam, grosso modo, vedar o tratamento de dados pessoais. Bem na realidade, o que elas pretendem é conferir aos titulares de dados pessoais instrumentos jurídicos capazes de assegurar a autodeterminação informativa destes mediante a prevalência do direito ao controle de informações.

Isso tudo por meio do reconhecimento de direitos aos titulares e da imposição de deveres, com consequente responsabilidade, àqueles cujas operações econômicas envolvem tratamento de dados, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas.

Não basta, por essas e outras, que a pessoa seja deixada em paz, mas que possa escolher aquilo que quer relevar aos outros, sabendo, para tanto, quais dados seus estão sendo tratados, por quem e do por quê.

Do contrário, todas as legislações aqui mencionadas, sem o núcleo motor que é a privacidade ressignificada, estariam esvazias e inaptas a perseguir o objetivo para quais foram concebidas: a proteção da pessoa em meio a sociedade da informação.

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