Depois de um livro da Marilene Chauí cair-lhe sobre a cachola enquanto tentava pegar um café em sua biblioteca, a raposa Olavo teve um piripaque, arregalou os olhos e caiu duro no chão, batendo as botas. Ao chegar no Céu, foi recebido pelo urso São Pedro, entediado, segurando a chave do Paraíso em uma das mãos e a “capivara” de Olavo na outra.
São Pedro: – Hum. Então você é a raposa Olavo?
Raposa Olavo: – Sim, o grande filósofo dos animais.
São Pedro: – Por Hegel!! Sua lista de pecados é mais constrangedora do que o resultado do teste de Q.I. do Eduardo Bolsonaro.
Raposa Olavo: – Quem escreveu isso deve ter sido alguém do Foro de S. Paulo.
São Pedro: – Você mentiu desavergonhadamente, distorceu inescrupulosamente, manipulou deliberadamente, omitiu intrinsicamente e criou problemas para cinco gerações daquele pobre país de desavisados.
Raposa Olavo: Bem, depende do ponto de vista…
São Pedro: – Espalhou boatos cabeludos, semeou ódio, estimulou a violência. Esse é o ponto de vista. Você colocou o Ernesto Araújo no Itamaraty!!!
Raposa Olavo: – Mas…
São Pedro: – O Weintraub no MEC!!!
Raposa Olavo: – Eu…
São Pedro: – O Rodrigo Constantino surgiu por sua causa…
Então, com olhar inquisidor, São Pedro gritou em fúria: O seu lugar é direto no Inferno!
Raposa Olavo: Não, por favor, não. Eu faço o que precisar para corrigir isso. Eu não posso ir para o Inferno. Ouvi dizer que todos são comunistas lá…
São Pedro: – Você vai fazer o seguinte, seu charlatão. Você voltará para a Terra e irá admitir para todo mundo que você criou toda essa lenga-lenga conspiratória pelo singelo motivo de ser um lunático desvairado. Você disse que Hegel é satanista e insinuou que o príncipe, de Maquiavel, era Lúcifer! Isso é coisa que um filósofo faz???
Raposa Olavo: – Ok, eu volto, eu volto.
II
A raposa Olavo acordou do piripaque com um espasmo que deixou os outros animais espantados, saltou do caixão esbaforido e, em pé sobre a mesa de salgadinhos, conclamou seus seguidores a segui-lo até um grande auditório em Brasília, onde ele faria as revelações finais sobre a vida, a morte, o mundo e o Universo.
O boato da ressurreição da raposa Olavo correu o país. Todos os seus alunos e seguidores, novos e velhos, fizeram questão de estar presentes na grande noite. Assim como canais de TV chapas-brancas, a imprensa marrom, políticos lunáticos, astrólogos, vendedores de pirâmides, terraplanistas e picaretas em geral. Todos estavam lá, orgulhosos da ressurreição de seu mestre. O desfile de alunos e fãs da raposa Olavo em noite da revelação parou a cidade. O esquilo Kim, o javali Eustáquio, a cobra Carla, o cavalo Constantino, o mussaranho Allan, o burro Abraham, a colibri Sara, não faltou um. Até as célebres bactérias 01, 02 e 03 deram o ar de sua desgraça.
III
No auditório apinhado de bichos.
Raposa Olavo: – Bem, pessoal. Tenho que contar algumas coisas para vocês. Eu morri, mas voltei para revelar a Verdade para vocês. Tudo o que falei e tudo o que escrevi… não passa de cascata pura e simples. Paranóia deslavada.
A plateia acha graça. Pensa que é mais uma das tiradas da Raposa Olavo.
Raposa Olavo: – Não, gente. É sério. Tudo bobagem. Aquele lance de a KGB, o Foro de São Paulo… oohhhh que meda! Tudo superdimensionado para assustar as ovelhinhas, os carneirinhos e os cabritos. Tudo ficção. Como se um daltônico descrevesse para um cego as belezas de um arco-íris.
A plateia não entende muito bem. Alguns sorrisos amarelos condescendentes são exibidos timidamente.
Raposa Olavo: – Hahaha. Olha, eu cheguei a dizer que não tenho argumentos para refutar o terraplanismo. Não, gente. A Terra não é plana. O nazismo não é de esquerda, a Inquisição matava, sim, judeus… como? Sim, era pura balela. Eu disse que a Inquisição não matava judeus. É claro que matava, putaquepariu. O que eles faziam era converter os judeus em cristãos, para depois matá-los. Esse é um exemplo do estilo de distorção que pratico para enganar ignorantes. Vocês nunca perceberam, porra???
A platéia está em completo silêncio. A colibri Sara é a primeira a se levantar.
Colibri Sara: – Petista! Petista infiltrado!
Javali Eustáquio: – Comunista!
Mussaranho Allan: – Socialista fabiano.
Raposa Olavo: – Calma, não fiquem bravos.
Cavalo Constantino: – Ele foi abduzido pelo Foro de São Paulo.
Raposa Olavo: – Ei, ainda sou eu quem está falando. Vocês devem obediência a mim.
Zebu Azambuja: – Analfabeto funcional!
Caramujo Araújo: – Queimem o farsante!
A multidão sequestra a raposa Olavo, amarra-o em um tronco e o leva-o carregado.
Raposa Olavo: – Calma. Eu criei vocês.
Colibri Sara: – Queima! Queima!
Hipopótamo Bernardo, espumando de ódio: – Queimem o ateu!
Raposa Olavo: – Era só o que me faltava.
Multidão: – Queima! Queima!!!
A turba, de tochas e ancinhos em mãos, carrega a raposa Olavo para as montanhas, onde ele é queimado em um ritual macabro dentro de um homem de palha com a cara do Benito Mussolini.
sensacional.
Parabéns pelo texto!
Muito inteligente, crítico e divertido…
Que a vida imite a arte nesse caso, né!!!
Nossa!