A guerra da Ucrânia é o prato de entrada no banquete da indústria de armamentos

Por trás de qualquer invasão a um país soberano, que inevitavelmente causa uma grande mortandade de civis, estão os comandos de nacionalistas autoritários

Quanto mais olho para a Europa, Otan, Estados Unidos, Boris Johnson, Putin, Zelenski, mais concordo com Carl Von Clausewitz, militar e estrategista, autor da obra Da Guerra, publicado em 1832: “A guerra é uma simples continuação da política por outros meios.”

Por trás de qualquer invasão a um país soberano, que inevitavelmente causa uma grande mortandade de civis, estão os comandos de nacionalistas autoritários, como de um Vladimir Putin. A mente deste ex-agente da KGB não é diferente de outros psicopatas que arrasaram a Europa, como Adolf Hitler, Francisco Franco ou Benito Mussolini e seus desejos megalomaníacos. Se olharmos bem de perto, também não é diferente de um Donald Trump, que quase provocou uma guerra civil nos EUA ao não aceitar a derrota nas eleições e incentivar a invasão ao Capitólio ou de um Jair Bolsonaro & filhos, que tentaram orquestrar uma invasão ao Supremo Tribunal Superior para derrubar seus ministros.

Joseph Goebbels. Foto: reprodução.

Em geral elegemos mal nossos representantes e vemos de tempos em tempos o despertar de novos discípulos de Maquiavel, onde “o fim justificam os meios” e para quem a formação de “gabinetes de ódio” serve como um instrumento para se criar falsas notícias e se manter no poder. Não há dúvidas que a famosa frase de Joseph Goebbels, ministro da propaganda na Alemanha Nazista, “uma mentira dita mil vezes torna-se verdade”, ainda orienta muitos dos senhores da guerra. Uma boa propaganda promove o ufanismo e cria “mitos”. Na era do nazismo, no início dos anos 1940, o exército alemão tinha o lema “Deus conosco” e Hitler tinha como slogan: “Alemanha acima de tudo” (“Deutschland über alles”). Parentes de soldados mortos na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) recebiam uma mensagem de condolências com o slogan “Pelo líder, povo e pela pátria”.

Tanto Trump quanto Bolsonaro também recorreram aos slogans que apelam para o perfil ufanista e religioso do americano e do brasileiro conservador: “Make America Great Again” não é diferente do “Brasil Acima de Tudo, Deus Acima de Todos”. Putin com o passar do tempo também aprendeu a usar bem as palavras, invertendo as acusações para quem está contra a invasão na Ucrânia: “Esses por trás dos protestos querem o poder e não vão parar por nada. Eles recorrem ao terror, aos assassinatos. São nacionalistas, neonazistas, ´russofóbicos´ e antissemitas”.

Filhos do Bolsonaro: da esquerda para a direita, na foto, Flávio (01), o presidente Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro (03) e Carlos Bolsonaro (02) – Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE

Narrativas são criadas para os caudilhos permanecerem no poder a qualquer custo. No entanto, é preciso ter cuidado quando tentam nos convencer sobre “mocinhos” e “bandidos”, pois é difícil distinguir a diferença de um sobre o outro, quando mísseis destroem hospitais e escolas e balas começam a voar sobre as cabeças de crianças. Não podemos esquecer que uma das maiores farsas da história foi a justificativa para a invasão do Iraque pelos Estados Unidos, em 2003, após o ataque terrorista às torres gêmeas em Nova Iorque, em 11 de setembro de 2001. A mentira contada pelo governo americano e britânico, apoiados pelo discurso hegemônico do jornalismo ocidental, de que o “bad boy” Saddam Hussein escondia armas químicas e biológicas para destruição em massa, custou a vida de pelo menos 200 mil pessoas (em estimativas conservadoras), sendo a maior parte de civis. Além de mais de 4 mil soldados americanos e quase 200 britânicos mortos em combate. As supostas armas nunca foram encontradas, o que desgastou mais ainda a imagem do então republicano conservador, presidente George W. Bush e causou a renúncia de Tony Blair, primeiro-ministro do Reino Unido.

A guerra fabricada manteve os Estados Unidos por oito anos em território iraquiano e custou aos cofres americanos pelo menos US$ 800 bilhões. Por detrás de tudo isto, reservas conhecidas de 115 bilhões de barris de petróleo, o que é mais do que cinco vezes o total das reservas americanas. A saber, nem Bush, nem Blair foram condenados por crimes de guerra! Putin vem mentindo desde o início do cerco de tropas russas à Ucrânia e agora sabemos qual eram suas intenções. Com quase um mês de lançamento de bombas sobre aquele país e centenas de mortes de civis, muitas delas crianças, já se pode acusar Putin de criminoso de guerra. Resta saber se quando tudo isto acabar, ele será condenado!

Ataque terrorista às torres gêmeas em Nova York, em 2001, justificou a invasão do Iraque em 2003. Foto: reprodução.

As mentes distorcidas de adoradores de poder e armas estão aí na história para nos mostrar. Nos anos 80, Margaret Thatcher, a “dama de ferro”, que reprimia violentamente a greve de mineiros no Reino Unido, mandou suas tropas para o outro lado do mundo a fim de retomar as Falklands, um arquipélago cheio de pedras, invadida por argentinos sob o comando de uma ditadura militar. Na época, o general Leopoldo Galtieri tentou salvar um governo falido, apelando para o nacionalismo. No começo dos anos 90, também víamos a exaltação ufanista deixar um rastro de sangue na Europa que não se via desde a Segunda Guerra Mundial. A Guerra da Bósnia, entre 1992 e 1995, que envolveu sérvios, croatas, bósnios, enrolados em bandeiras e em suas religiões, causou a morte de mais de 200 mil pessoas (quase 50% de civis) e quase 2 milhões de deslocados. Ao término do conflito, líderes nacionalistas bósnios sérvios como Radovan Karadžić e sérvios como Slobodan Milošević foram condenados por crimes de guerra, genocídio e “limpeza étnica”.

Hoje a guerra é mais midiática e temos de ter um olhar crítico sobre as imagens repetidas que nos chegam na telinha do celular da tragédia humana na Ucrânia. É certo que não podemos ficar insensíveis ao desespero dos refugiados em grandes filas, caminhando para as fronteiras, com praticamente a roupa do corpo. Sem hesitar, o mundo deve condenar as ações de Putin e o absurdo que estamos assistindo em pleno século 21. Por outro lado, temos o comediante Volodymyr Zelenski, apresentado como o presidente “herói” neste conflito. Sendo ator, ele sabe muito bem desempenhar este papel, no entanto, na realidade, o candidato Zelenski teve grande apoio de oligarcas ucranianos para se eleger e aceitou os milicianos da ultradireita no seu governo, depois da suposta “revolução” de 2014. Hoje, o Batalhão de Azov, formado por neonazistas, faz parte do exército ucraniano e tem várias acusações de abusos de direitos humanos e crimes de guerra na guerra civil no leste do país, com denúncias de casos de torturas, estupros, saques, limpeza étnica, além de perseguição a minorias como homossexuais, judeus e russos. Sim, a Ucrânia tem o direito de se defender e de não entregar seu país a um ditador, mas a que preço, enquanto o mundo assiste a mais uma crise de milhões de refugiados? Como toda a guerra, mais uma vez aqui a grande vítima será a população civil. É preciso lembrar, que neste palco de interesses, Zelenski flertava abertamente com uma Otan expansionista, liderada pelos Estados Unidos, com um grande medo da dependência crescente da Europa do gás russo e de perder domínio no território.

Zelenski, presidente da Ucrânia. Foto: Agência Brasil.

A pressão da águia careca do Norte sobre o urso pardo do Leste pode estar nos levando a uma guerra muito maior e que poderá criar uma nova ordem global geopolítica e econômica. Se os Estados Unidos contavam com um conflito para poder se beneficiar e manter seu status de “xerife do mundo”, o tiro pode sair pela culatra. Pois o que vemos é uma maior aproximação da Rússia e China (ainda “neutra” no conflito), que há muito tempo desejam sair da dependência do dólar como moeda dominante nos negócios globais. Um com grandes recursos naturais e o outro com avançadas tecnologias, suficientes para quem sabe, ancorar a economia da Eurásia em outra moeda. Sabe-se que os dois países juntos têm polpudas reservas econômicas (leia-se ouro, petróleo, moedas virtuais, tecnologias de ponta e diversas commodities) para se garantirem por um bom tempo, independentemente das sanções do ocidente.

Com este novo cenário, especialistas também preveem que haverá mudanças nas políticas de gastos dos países a nível global. Por exemplo, uma parte do orçamento da Alemanha que até o momento iria para resolver os problemas ambientais, como a redução das emissões de carbono, poderá ir para gastos militares, tendo em vista que os alemães estão abertamente se envolvendo no conflito, uma posição que não se via desde a Segunda Guerra Mundial. Já a Suíça, tradicionalmente neutra, agora enviou armas para a Ucrânia. Assim como os Estados Unidos e a Rússia certamente irão ter mais facilidade para convencer seus parlamentos a aumentar os orçamentos para fabricação de armas.

Vladimir Putin.

Quando olhamos para a quantidade de armamentos fabricados no mundo, não devemos ser ingênuos em pensar que não desejem usá-los. Apesar da pandemia, o gasto militar global teve um incremento de 2,6% em 2020, chegando a US$ 1,98 trilhão. Os EUA gastaram cerca de US$ 778 bilhões desse total, enquanto a Rússia cerca de US$ 65 bilhões. Estes países, assim como o Reino Unido e países europeus, que também lucram com o comércio de armas, precisam saber da eficácia deles, afinal esta é a melhor propaganda de marketing para se aumentar as vendas.

Não sabemos o quanto vai durar este massacre na Ucrânia e como a Europa e os Estados Unidos irão se posicionar diante do avanço russo, mas com certeza, daqui para frente a festa será da indústria militar, elevando lucros de grandes empresas e governos conservadores. Jamais imaginávamos a Europa como sendo mais uma vez o palco de uma guerra desta natureza, pois era de se pensar que haviam aprendido a lição depois das atrocidades do nazismo. A Guerra da Bósnia já tinha sido um alerta e as tensões da Ucrânia e Rússia estavam ali, gritando, mas os líderes europeus e seus representantes parlamentares, dormiram em cadeiras confortáveis dos seus escritórios luxuosos! Quando devíamos estar preocupados com o controle de emissões de gases do efeito estufa e as mudanças climáticas que ameaçam a vida no Planeta, vemos a política por outros meios aí novamente, mais bélica e com tendência a aumentar. Aquilo que começou com uma salada russa azeda, pode se tornar um grande banquete de acionistas e CEOs dos instrumentos da morte.

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