Quadrinho olha para a complexa relação entre pai e filha

Enquanto disseca as semelhanças e diferenças com o próprio pai, Alison Bechdel parece ter descoberto em “Fun home” a essência de ser um humano

Um pai frio e distante, obcecado por restaurar a estética vitoriana do lar de sua família. Um homossexual não assumido, que busca, por meio de ornamentos, fabricar uma imagem para o mundo. Assim se definem os contornos de Bruce Allen Bechdel – pai de Alison Bechdel, cartunista e autora do quadrinho “Fun Home”.

A HQ é um mergulho nas memórias da autora, que tenta investigar a figura misteriosa do pai – morto recentemente, no que parece ser um suicídio disfarçado. É da relação do dois, que varia entre o antagonismo e a semelhança, que Alison tenta também entender sua própria trajetória.

No Brasil, HQ foi publicada pela Todavia. Foto: Divulgação/Todavia

“Fun Home” foi publicado em 2006, e chegou a ser eleito “Livro do ano” pela Time, mas só chegou ao Brasil em 2018. A tradução é de André Conti, um dos sócios fundadores, e editor, da Todavia. A obra também ganhou uma premiada versão musical, em 2015, na Broadway.

Um drama sem dramas

Nascida nos anos 1960, Alison foi criada na cidade de Lock Haven, na Pensilvânia. Na pequena cidade, a infância da cartunista se passou entre a funerária comandada pela família, os livros e os adornos do pai – que também era professor de inglês.

O título, inclusive, é uma brincadeira com a expressão “Casa funerária” e o termo “diversão” (fun) em inglês, e já entrega um pouco do humor ácido que acompanha Alison.  

Na obra, as principais conexões entre pai e filha são a homo afetividade, e o amor pelos livros. É por meio desses elementos centrais que Alison tenta olhar para o emaranhado da relação com a figura complexa do pai. Enquanto traça paralelos entre ficções e a sua vida, a autora navega por memórias da infância, passando pela adolescência até chegar à vida adulta. 

Autora é sincera sobre sentimentos envolvendo o pai. Foto: Divulgação/Todavia

Poderia ser piegas, mas não é. Talvez seja pela sinceridade visceral, que mais do que explorar aspectos positivo e negativos do relacionamento familiar, aborda toda a zona cinzenta que há entre esses polos. Ou pela forma como Alison descreve as situações e sentimentos, por piores que sejam, sem grandes melindres ou dramas.

“Eu não deveria fingir que sei o que meu pai era”, afirma a cartunista já nas páginas finais de sua “tragicomédia em família”. No fim, é um pouco como se Alison conseguisse entender que ser um humano é, justamente, uma tragicomédia: estar (e seguir) mergulhado em dúvidas, histórias e sentimentos – bons e ruins.

Livro

“Fun home: uma tragicomédia em família”, de Alison Bechdel. Tradução de André Conti. Todavia, 240 páginas, R$ 59,90.

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