Vamos falar sobre violência obstétrica?

Segundo pesquisa, uma em cada quatro mulheres sofre algum tipo de violência durante o parto

Se você quer saber um pouco mais sobre este tema, ou se ainda não ouviu falar disso, vem comigo pelas próximas linhas. O termo realmente assusta. No rol das violências praticadas em virtude do gênero está, também, a violência obstétrica, que é uma forma de denominar os abusos que podem ocorrer com a mulher em virtude da sua gravidez, antes, durante e logo após o parto.

Segundo uma pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo em conjunto com o Serviço Social do Comércio (SESC), uma em cada quatro mulheres sofre algum tipo de violência durante o parto. Essa violência pode ser física, verbal ou psicológica, incluindo a realização de procedimentos excessivamente invasivos ou desnecessários e submissão da mulher a situações humilhantes ou vexatórias, realizadas por parte de alguns profissionais de saúde ou que trabalham nas clínicas e hospitais.

Algumas mulheres, na pesquisa, mencionaram ter ouvido frases como estas: “Não chora não que ano que vem você está aqui de novo. Na hora de fazer não chorou, por que está chorando agora? Se gritar eu paro agora o que eu estou fazendo, não vou te atender. Se ficar gritando vai fazer mal pro seu neném, seu neném vai nascer surdo”.

No Brasil, não existe uma lei federal que regule o tema. Porém, no Paraná, existe uma lei estadual que visa coibir a violência obstétrica e evitar que mulheres sofram desnecessariamente neste momento da vida tão delicado e importante: trata-se da Lei Estadual 19.701/2018, que sofreu uma relevante alteração agora, em 2020, em relação à escolha do parto pela gestante.

Conforme tal lei estadual, configura-se violência obstétrica qualquer ação ou omissão que cause à mulher morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico; a negligência na assistência em todo período gravídico e puerperal; a realização de tratamentos excessivos ou inapropriados e sem comprovação científica de sua eficácia e ainda; e a coação com a finalidade de inibir denúncias por descumprimento do que dispõe a lei.

É direito da mulher, como de qualquer pessoa, ter respeitada sua dignidade humana. Não sofrer violência é um dos aspectos mais básicos disso. Além do mais, é importante que a gestante saiba que possui, por lei, além da obrigação de ser respeitada, o direito a uma assistência humanizada em toda a sua gestação, inclusive no período pós-parto, o que inclui receber tratamento individualizado e personalizado, ter acesso a toda informação de que precisa sobre a gestação e o parto, bem como seus respectivos riscos.

A gestante tem direito, ainda, ao respeito às suas crenças e cultura. Isso significa, inclusive, que ela tem direito a participar da decisão acerca de qual modalidade de parto atende melhor às suas convicções, aos seus valores e às suas crenças. A escolha da modalidade do parto é algo novo na lei, alterada em março de 2020. Com esta nova alteração, a modalidade de parto não pode ser imposta à gestante, desde que se trate de uma situação eletiva, ou seja, de risco habitual.

A gestante pode, então, optar pela cesariana? Sim, pode, tanto no sistema público quanto no particular de saúde, contudo, desde que seja uma situação de risco habitual e que seja realizada a partir da 39.ª semana de gestação. Exige-se, também: que ela tenha recebido informações de forma pormenorizada sobre o parto vaginal e cesariana, seus respectivos benefícios e riscos; e que tenham sido realizadas as avaliações de risco gestacional durante o pré-natal. Cumpridos estes requisitos, a gestante deve assinar um termo onde conste a sua decisão e as características do parto, chamado de “termo de consentimento livre e esclarecido”.

É importante ressaltar, ainda, que pela lei, a gestante pode negar a realização de exames e procedimentos com propósitos exclusivamente de pesquisa, investigação, treinamento e aprendizagem ou que lhes causem dor e constrangimento, como, por exemplo: exame de toque (dilatação cervical) realizado por vários profissionais da saúde indiscriminadamente e a realização de episiotomia (corte na vagina), sem justificativa clínica, ou com o intuito apenas de acelerar o nascimento.

Caso algum direito da gestante seja violado, havendo ocorrência de violência obstétrica, denúncias podem ser feitas na Secretaria de Estado da Família e Desenvolvimento Social ou na Secretaria de Estado da Saúde, no Ministério Público Estadual ou por meio do disque-denúncia 181.

Se comprovada a situação de violência obstétrica, a lei prevê a penalidade de multa aos estabelecimentos no valor de R$ 106.600,00 e aos profissionais de saúde envolvidos, no valor R$ 10.660,00. Para ambos, o valor pode ser aplicado em dobro se houver reincidência.

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4 comentários em “Vamos falar sobre violência obstétrica?”

  1. MARCOS ROBERTO DE SOUZA PERES

    O texto é bem explicativo e muito interessante. O Estado do Paraná, mais uma vez, está na vanguarda da proteção aos direitos de todas. Espero que, de fato, esta lei possa colaborar para reduzir mais esta violência praticada contra a mulher. Parabéns pelo texto, Sthefani!

  2. “Caso algum direito da gestante seja violado, havendo ocorrência de violência obstétrica, denúncias podem ser feitas na Secretaria de Estado da Família e Desenvolvimento Social ou na Secretaria de Estado da Saúde, no Ministério Público Estadual ou por meio do disque-denúncia 181.”
    É muito sintomática a exclusão do CRM neste rol… Dá para entender perfeitamente, mas chega a doer.

    1. Os conselhos são de fato importantes. Os canais de denúncia elencados no artigo são os descritos na lei de violência obstétrica. Uma eventual denúncia por estes canais deverá apurar a conduta dos profissionais, inclusive com notificação aos conselhos de classe. De qualquer forma isso pode ser feito sim diretamente ao conselho.

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