“Com a pandemia e o isolamento, o que temos visto com mais frequência é falta de higiene, roupas compridas para cobrir sinais físicos, ou emagrece muito ou engorda muito, crises de ansiedade e automutilação. Elas criam ‘uma barreira’ visual para evitar o desejo dos agressores. Nesse sentido, muitas desenvolvem distúrbios alimentares (obesidade, anorexia) e deixam até de realizar a higiene pessoal.”
Quem conta é a presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB/PR), Bruna Saraiva. “Qualquer mudança no comportamento padrão pode estar vinculada a abusos, então deve-se ficar atendo a toda mudança de comportamento. Intensificando a observação, é possível identificar potenciais vítimas de cunho sexual”, explica.
O número de casos de estupro registrados em Curitiba no primeiro semestre de 2020 caiu 29% em relação mesmo período de 2019. Enquanto neste ano foram 265 vítimas, no ano passado foram 314. A maioria envolvendo crianças entre 0 e 13 anos. Os dados são da Secretaria Estadual de Segurança Pública (Sesp).
“Os casos notificados diminuíram, mas não podemos imaginar que as violências também tenham reduzido, mas aumentado, e muito”, analisa a advogada. Ela lembra que muitas vítimas relatam no ambiente escolar os abusos sofridos, tendo o professor como referência de proteção.
Com a suspensão das aulas presenciais, a distância dos educadores e o isolamento de outras pessoas da família, como avós e tios, fica mais difícil a percepção das marcas físicas e psicológicas da violência infantil. Por isso é importante ficar atento. “Os agressores sexuais, na maioria das vezes, pertencem ao ambiente familiar ou comunitário da vítima.”
Sinais
Segundo trabalho da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB/PR, dentre os principais sinais de violência sexual que podem ser observados nas vítimas estão:
Físicos: contusões, fraturas, marcas de mordida, marcas de queimadura, lacerações nas mucosas vaginais e anais, perda do controle esfincteriano, dificuldade para deglutir e doenças sexualmente transmissíveis.
Psicossomáticos: mal-estar, incontinência urinária, alergias, dores abdominais, dores de cabeça, falta de ar, desmaios, náuseas e vômito.
Psicológicos: fobias, crises de ansiedade, ataques de pânico, transtorno obsessivo compulsivo, transtorno dissociativo, ideação suicida, autolesão, uso de drogas, alcoolismo, dificuldade de ajustamento comportamental, transtorno de estresse pós-traumático, ninfomania, baixa autoestima, transtornos alimentares, problemas de memória e atenção, perturbações do sono e agressividade.
Comportamental: comportamentos infantis, choro frequente, isolamento dos colegas, medo diante de algumas pessoas (gênero específico ou pessoa específica), baixa no rendimento escolar, faltas excessivas ou pontualidade excessiva, não quer voltar para casa após a aula, fica em constante estado de alerta, tenta mostrar-se “boazinha”, bate nos colegas, pratica bullying, maltrata animais, desrespeita a professora e funcionários da escola, usa roupas inapropriadas para o clima, usa roupas rasgadas ou suja, tem pouca higiene (mal hálito, mal cheiro, sujeira nas unhas e pele, cabelos oleosos), não entrega as tarefas escolares.
Denuncie
Denunciar estes sinais é um dever social, aponta Bruna Saraiva. “É no silêncio dessas informações que nossos pequenos vêm sendo violados. O momento exige urgente e eficaz implementação de políticas públicas voltadas à prevenção dessas violações e ao atendimento célere às vítimas e a suas famílias. Faltam, claramente, campanhas de conscientização e de combate às violências, divulgação dos canais de denúncias e fortalecimento dos vínculos familiares.”
Para denunciar ligue 156, 100 ou 181. Não é necessário se identificar.
Números
Entre janeiro e junho de 2020, a Secretaria da Segurança Pública do Paraná (Sesp) registrou 265 casos de estupro em Curitiba. O número é 29% menor do que no mesmo semestre de 2019, em que foram 374 vítimas.
Os bairros da Capital que mais tiveram registros de vítimas em 2020 foram Cidade Industrial de Curitiba (CIC), Sítio Cercado, Cajuru, Tatuquara e Uberaba.
Veja os dados por faixa etária:
- *2019 – 374 vítimas
209 – entre 0 e 13 anos
80 – entre 14 e 18 anos
85 – com mais de 18 anos
- *2020 – 265 vítimas
144 – entre 0 e 13 anos
50 – entre 14 e 18 anos
71 – com mais de 18 anos
Há uma importante frase do texto que ficou ambígua: “ Ela lembra que muitas vítimas relatavam os abusos sofridos em seu ambiente escolar, tendo o professor como referência de proteção.”
Relatavam no ambiente escolar
Ou Sofridos no ambiente escolar?
Oi, Milena, realmente deu margem pra duas interpretações. A correta é: As crianças relatam no ambiente escolar os abusos sofridos, tendo o professor como referência de proteção. Já arrumei lá, obrigada!