Bolsonaro nomeia diretor universitário e revolta comunidade acadêmica

Diretor-geral temporário era assessor do ministro da educação e foi hostilizado por alunos

Durou pouco a tentativa de Maurício Aires Vieira de ocupar sua recém-destinada sala no Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet/RJ). Ao chegar ao campus nesta segunda-feira (19), o diretor-geral pro tempore (temporário), nomeado por Jair Bolsonaro (PSL), avistou uma barreira de alunos que gritavam “Fora, interventor!”.

A confusão foi tanta que Vieira logo deixou o prédio. Sua presença também não é bem avaliada pelos demais representantes da comunidade acadêmica, que veem na interferência do governo federal uma ruptura da autonomia institucional e um desrespeito à eleição universitária democrática, realizada em abril de 2019.

No pleito, o então vice-diretor, Maurício Saldanha Motta, venceu outros dois candidatos. Um deles, no entanto, recorreu da votação para o Ministério da Educação (MEC), que decidiu enviar um representante para o cargo até analisar o recurso. Vieira era assessor do ministro da educação, Abraham Weintraub, e sua nomeação foi divulgada no Diário Oficial de 16 de agosto.

Segundo o MEC, o cargo é provisório e foi motivado pelo fim do mandato do diretor-geral anterior. A decisão seria necessária até a conclusão da análise do processo eleitoral questionado.

No mesmo dia da nomeação, porém, o Cefet/RJ reafirmou a legitimidade da votação. “A eleição ocorreu de forma democrática, tramitando normalmente pela Procuradoria Jurídica, pelo Conselho Diretor, pela Comissão Eleitoral e pela própria Consultoria Jurídica do MEC (Conjur).”

De acordo com a entidade, o candidato eleito ficou por mais de um mês exercendo a função de vice-diretor em exercício da direção-geral. “Foi uma surpresa a nomeação de um diretor-geral pro tempore”, diz a nota, assinada por vários diretores dos campi do Rio de Janeiro.

“Diante do exposto, com essa notícia recebida de forma intempestiva, os diretores alertam a comunidade acadêmica e administrativa do Cefet/RJ para a ruptura do processo democrático e da autonomia institucional, que demonstra total falta de respeito à instituição.”

Foto: Reprodução Redes Sociais

Entidades Nacionais

Nesta segunda (19), entidade nacionais representativas dos dirigentes universitários manifestaram apoio à nomeação dos gestores eleitos em processos democráticos. “Por respeitar as escolhas das comunidades acadêmicas, cujos pleitos são realizados com transparência e de acordo com os ritos legais, o Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) e a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) sustentam a nomeação dos candidatos escolhidos em conformidade com a maioria de votos”, afirma a nota.

Segundo as entidades, a nomeação dos primeiros colocados em processos eleitorais deve ser realizada dentro da menor brevidade possível, respeitando a autonomia institucional e aplicando os valores democráticos historicamente implementados no país. “O Conif e a Andifes se manifestam contrários à nomeação de gestores externos às instituições, mesmo que de forma pro tempore, e defendem que seja respeitada a vontade apresentada nas eleições.”

Para o reitor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e vice-presidente da Andifes, Ricardo Marcelo Fonseca, “as comunidades universitárias veem com muita preocupação estes casos, que estão ficando reiterados, de ser ignorada a vontade comunidade pra colocar pessoas ou pouco votadas ou nem mesmo votadas, como é o caso de dirigentes pro tempore”. Isso, além de desrespeitar a tradição acadêmica – que pressupõe liberdade e autonomia – acaba sendo “um tiro no pé da instituição e das próprias pessoas que são nomeadas”.

“Universidades e institutos são instituições complexas que para serem geridos precisam da legitimidade interna. Quando são colocadas nesse ambiente – de professores, técnicos e estudantes – pessoas que não foram escolhidas por esta própria comunidade, a gestão institucional fica tremendamente prejudicada e a falta de legitimidade pode tornar a situação ingovernável. Ninguém ganha com isso”, avalia o reitor da UFPR.

O presidente da Andifes, e reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), João Salles, reitera a importância de respeitar a consulta e a vontade da comunidade. “Isso é fundamental para uma boa gestão em todas as dimensões”, conclui.

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