Suplicy de Lacerda: como a UFPR resolveu o impasse de sua “estátua de Borba Gato”

Busto de ex-reitor da Universidade foi derrubado em maio de 1968 e, quase 50 anos depois, em 2014

A Universidade Federal do Paraná tem em frente ao prédio da Reitoria sua própria versão da estátua de Borba Gato. Não da estátua, propriamente, mas da disputa política e histórica que cerca as homenagens a figuras controversas. Assim como o monumento do Bandeirante paulista, o busto de Flávio Suplicy de Lacerda já foi atacado, mais de uma vez, por quem achava que ele não deveria estar ali.

Suplicy de Lacerda foi um engenheiro, professor e político que ocupou cargos de destaque na educação brasileira. Foi reitor da UFPR por 19 anos e ministro da Educação do governo militar do general Castelo Branco, entre abril de 1964 e janeiro de 1966. Ele apoiou a ditadura militar desde o primeiro momento – e trabalhou em prol de suas ideias autoritárias. Foi o protagonista do acordo MEC-Usaid, que queria instalar o ensino pago no país, e promotor do sufocamento das entidades estudantis, através da lei Suplicy. 

Busto de Suplicy de Lacerda derrubado em 1968 e em 2014 (Crédito: Sindicato dos Docentes das Instituições de Ensino Superior)

Com esse currículo, Suplicy de Lacerda virou inimigo do movimento estudantil. Uma inimizade longeva. Seu busto foi derrubado pela primeira vez em maio de 1968 e voltou a cair em abril de 2014, quando o golpe militar completou 50 anos. 

Após a segunda derrubada do busto, a universidade, então sob o comando de Zaki Akel, condenou o ato dos estudantes. 

“A Reitoria da UFPR lamenta o episódio da retirada do busto em bronze do Reitor Flavio Suplicy de Lacerda de seu pedestal nos jardins do complexo da reitoria e as subsequentes agressões e pichações realizadas por um grupo de manifestantes”, começava a nota do então reitor. 

No meio do texto, Zaki admitiu que Suplicy apoiou a ditadura, mas defendeu seu trabalho na universidade. 

“Não podemos apagar a história, nem tampouco reescrevê-la. O reitor Flavio Suplicy de Lacerda foi um dos líderes do intenso esforço que resultou na federalização da Universidade do Paraná, contribuindo assim para que tivéssemos a primeira universidade pública e gratuita de nosso Estado”, escreveu.

Após um período de impasse sobre o destino do busto, a Universidade, já com Ricardo Marcelo Fonseca na Reitoria, iniciou um processo de debate sobre qual deveria ser o destino da homenagem ao ex-reitor. 

Em 2017 veio a decisão: o Conselho Universitário aprovou um parecer elaborado pela professora Vera Karam de Chueiri, do Direito, que propunha a criação do Museu do Percurso como forma de solucionar o impasse sobre o busto. Assim, problematizada e contextualizada, a homenagem a Suplicy de Lacerda voltou a seu lugar.

O Museu se propõe a confrontar a história “sem ocultar, fraturar ou dissimular os fatos, mas contextualizar e elucidar o passado, os atores e o patrimônio histórico e artístico tombado da UFPR”. São quatro marcos: o Edifício José Munhoz de Mello (a antiga sede da Polícia Federal, na Rua Ubaldino do Amaral, marcada por atos duros de repressão do regime militar). O segundo, o busto do professor Flavio Suplicy de Lacerda. O terceiro é o Edifício D. Pedro II (ao lado do prédio da Reitoria), onde foi instalado um marco lembrando o histórico cerco promovido pelos estudantes em protesto contra a ditadura, em 1968. E o quarto é um busto homenageando o advogado e ex-professor da UFPR, cassado pela ditadura militar em 1964, José Rodrigues Vieira Netto, instalado no prédio histórico da UFPR, na praça santos Andrade.

Busto do professor Vieira Netto, instalado em 2020 como parte do Museu do Percurso (Foto: Sucom/UFPR)

Em cada um desses marcos, há documentos que podem ser acessados pela comunidade, através de um QR CODE fixado em cada um destes monumentos, com as informações históricas destes marcos. 

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1 comentário em “Suplicy de Lacerda: como a UFPR resolveu o impasse de sua “estátua de Borba Gato””

  1. FLAVIO SUPLICY DE LACERDA, MINISTRO DA EDUCAÇÃO (DO GOVERNO DO MARECHAL CASTELO BRANCO) é odiado pela esquerda e, máxime, pelos radicais, no Paraná, como, demais, tudo quanto se relacione com os governos dos militares de 1964 a 1982.
    Mas sempre é oportuno lembrar que Flávio, reitor, federalizou a universidade do Paraná e, de privada e paga que era, tornou-a PÚBLICA E GRATUITA. Construiu o Centro Politécnico inteiro (salvo o que se lhe acrescentou depois), todo o Hospital de Clínicas; ampliou o prédio “histórico” da praça Santos Andrade, cuja fachada de colunas e escada construiu; construiu o prédio da Casa da Estudante Universitária; criou a orquestra da universidade e a universidade volante, em que se propiciavam cursos no interior, aumentou em milhares as vagas discentes e em centenas as docentes; incrementou o ensino superior e transformou Curitiba na “cidade universitária”, como alguns curitibanos comprazem-se de ufanar-se dela.
    E foi ministro da Educação, mentor da lei que obrigava ao voto estudantil, nos grêmios estudantis, então monopolizados por minorias ativas, a despeito e com a passividade inerte das maiorias.
    E quando ministro, ao assumir funções e adentrar na residência que lhe foi destinada, arrolou-lhe o recheio: fez lista de tudo quanto nela se encontrava, para discernir, escrupulosamente, o que pertencia ao Estado e o que lhe pertencia, privadamente. Separou o público do privado; não os confundiu e, claro, ao deixar o cargo de ministro, na casa deixou o que pertencia ao Estado brasileiro.
    Agora, compare a atitude do conservador-reacionário-ditatorial-direitista-“etc.” Flávio Suplicy de Lacerda com o que corre do outro (o das alfaias do palácio do Planalto).
    E depois de tudo quanto ele fez pelo ensino, alguns radicais depredaram o patrimônio público, há dois anos, e arrancaram o busto dele, instalado na reitoria e nunca mais o devolveram, a troco da participação dele no governo de Castelo Branco, mas, convenientemente, esqueceram-se do quanto e do muito que ele fez em prol do ensino superior, inclusivamente em favor dos próprios que lhe depredaram o busto, como quem cospe no prato em que comeu.

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